WHYDAH GALLY: O BAÚ ESQUECIDO DOS SETE MARES

O navio WhyDah Gally carrega consigo não apenas uma história de pirataria, mas também um símbolo do século XVIII, período em que os mares eram dominados por aventureiros audaciosos e impiedosos.

O que torna sua história cativante é sua transição de um navio de comércio legítimo para uma das embarcações mais temidas pelos marinheiros daquele século, sob o comando de Samuel Bellamy, um pirata que ficou conhecido como “o rei dos piratas”.

Mas o que aconteceu com esse navio depois de sua ascensão à categoria de lenda? Como ele se perdeu no oceano, levando consigo um legado que seria esquecido por séculos até sua incrível redescoberta? Neste artigo, vamos percorrer a história do WhyDah Gally e o seu legado duradouro que ainda perdura.

O século XVIII e a Era da Pirataria

O século XVIII foi um período fundamental na história mundial, marcado por transformações de grandes proporções. No âmbito marítimo, esse período também ficou profundamente marcado pela ascensão e queda da pirataria, um fenômeno que se estendeu especialmente nas águas do Caribe, da costa da América do Norte e até as regiões do Atlântico Sul.

A Era da Pirataria, que se estendeu de meados do século XVII até o início do século XIX, foi impulsionada pela interação entre colônias europeias, comerciantes e piratas, que se aproveitaram do caos e da competitividade do comércio transatlântico.

O ambiente e comércio marítimo

Durante este período, as principais colônias como a Inglaterra, a França, a Espanha e os Países Baixos estavam em plena competição pelo controle das vias comerciais e das riquezas provenientes das colônias americanas.

O comércio transatlântico era vital para essas nações. No entanto, a extensa rede de vias comerciais oferecia uma oportunidade para aqueles que desejavam um caminho mais rápido para a riqueza: os piratas.

Os piratas saqueavam mercadores, navios e outras embarcações, tomando tudo o que podiam. A lacuna na vigilância britânica permitiu que figuras como Bartholomew Roberts, Edward Teach (o Capitão Barba Negra) e Samuel Bellamy prosperassem.

A ascensão da pirataria e o “Século de Ouro”

A pirataria alcançou seu auge nas décadas de 1710 a 1730, um período conhecido como o “Século de Ouro” da pirataria. Era um século de saques, mas também de um código de honra próprio, com algumas tripulações piratas oferecendo uma forma de vida, onde os direitos de voto e os lucros eram compartilhados.

Além disso, o ambiente social de muitas colônias britânicas, como as Carolinas e as Bermudas, ofereceu abrigo para esses homens e mulheres que se recusaram a se submeter à autoridade imperial. A pirataria se tornou uma forma de viver fora das restrições das leis coloniais.

Os piratas viam os mares como seu domínio e o saque de navios como uma forma de liberdade e aventura, muitas vezes atraindo pessoas de diferentes origens e classes sociais para suas tripulações. Neste contexto de expansão e caos, o WhyDah Gally não surgiu como um navio qualquer, mas como um símbolo de uma época marcada por aventura, audácia e uma busca incessante por riqueza.

A construção e a primeira jornada do WhyDah Gally

O WhyDah Gally foi primeiramente construído como um navio de carga, mais especificamente como uma galera – um tipo de embarcação fabricada para navegar principalmente nas águas do Atlântico e para servir ao comércio transatlântico.

A construção do navio remonta ao ano de 1715, na Inglaterra. Com cerca de 36 metros de comprimento, o WhyDah Gally foi criado para ser um navio rápido e resistente, ideal para transportar mercadorias valiosas entre a Inglaterra e suas colônias nas Américas. O navio possuía uma estrutura forte, com velas que lhe permitiam acelerar em alta velocidade, e um grande espaço de carga.

Transporte de mercadorias e captura pelos piratas

Seu formato inicial visava o transporte de mercadorias como especiarias, tecidos e metais preciosos entre a Inglaterra e os mercados americanos. Com um casco resistente e um contingente treinado para as exigências de longa viagem, o navio foi encarregado de realizar diversos percursos comerciais durante os primeiros anos de sua vida.

No entanto, a história do WhyDah Gally tomou um rumo inesperado quando, em 1717, foi apreendido por piratas, marcando uma virada radical em sua trajetória. Após ser capturado, o navio foi modificado para se tornar uma embarcação pirata. Retirando a carga comercial, os piratas adaptaram o WhyDah Gally para se tornar uma das embarcações mais temidas no mar.

Esse processo de transformação não se limitou apenas ao aspecto físico do navio, mas também ao seu papel no cenário de pirataria. Sob a liderança de Samuel Bellamy, o navio não só ganharia notoriedade pelos seus saques bem-sucedidos, mas também se tornaria um símbolo de uma nova era para os piratas.

O comandante Samuel Bellamy e a transformação em navio pirata

Samuel Bellamy, nascido na Inglaterra por volta de 1695, foi um dos piratas mais audaciosos do seu século. Seu apelido, “Black Sam” (sem tradução literal em português), evocava uma imagem de um pirata destemido e imponente. Ele começou sua carreira marítima como marinheiro comum, mas sua ambição o levou a se envolver com a pirataria.

Em 1716, Samuel Bellamy, então com cerca de 21 anos, decidiu se rebelar contra as autoridades e embarcou em um navio mercante. Ao longo do tempo, ele foi subindo na hierarquia dos piratas, até chegar ao ponto de assumir o comando do WhyDah Gally.

Liderança e governança

Conhecido por sua coragem e habilidade estratégica, era admirado por sua tripulação, que incluía homens de diversas nacionalidades e motivações. Ele oferecia uma forma de governança compartilhando os lucros dos saques com seus marujos.

O WhyDah Gally, agora sob o comando de Samuel Bellamy, se tornou um dos piratas mais procurados. Ele saqueava principalmente navios que transportavam riquezas do Novo Mundo para a Europa, aproveitando-se da velocidade e do poder de sua embarcação.

Samuel Bellamy, com seu charme e habilidades de liderança, foi capaz de manter os marujos fiéis e, juntos, eles ganharam uma grande quantidade de tesouros. Além dos saques, Samuel Bellamy se tornou uma figura carismática, quase mítica. Ele era conhecido por seu código de honra, que fazia com que os piratas sob seu comando se diferenciassem dos outros piratas mais inflexíveis.

A queda do WhyDah Gally

O fim do WhyDah Gally ocorreu de forma abrupta e dramática. Em abril de 1717, após meses de saques bem-sucedidos, o navio e sua tripulação se envolveram em uma caçada implacável com a Marinha Real Britânica, que estava cada vez mais empenhada em eliminar as forças piratas nas águas do Atlântico.

Samuel Bellamy e sua tripulação estavam se aproximando de Cabo Cod (Cape Cod, em inglês), na costa da Nova Inglaterra, quando uma grande tempestade atingiu o WhyDah Gally. A tempestade, uma das mais furiosas da temporada, fez com que o navio fosse encalhado e, eventualmente, naufragasse.

Ao longo das ondas revoltas, Samuel Bellamy perdeu o controle do WhyDah Gally, e o navio foi destruído pelas águas turbulentas, afundando rapidamente. Com a perda do navio, o império pirata de Samuel Bellamy chegou ao fim, e a pirataria no Atlântico foi rapidamente erradicada pelas forças britânicas.

A redescoberta do WhyDah Gally e as escavações

O navio naufragado permaneceu no fundo do mar por mais de 250 anos, a busca do WhyDah Gally começou em 1982, quando o caçador de tesouros Barry Clifford e sua equipe começaram a investigar as águas turbulentas perto de Cabo Cod, na costa de Massachusetts.

Em 1984, após dois anos de buscas intensas, Barry Clifford e sua equipe finalmente localizaram o que parecia ser o WhyDah Gally. Essa redescoberta foi um marco histórico, pois se tratava do primeiro naufrágio de um navio pirata que havia sido identificado com precisão e não apenas encontrado por acidente.

Escavações e descobertas

As escavações subsequentes revelaram uma impressionante quantidade de objetos, incluindo cânions, moedas, relíquias pessoais dos marujos e fragmentos do próprio navio.

A redescoberta do WhyDah Gally forneceu uma visão sem precedentes sobre a vida no mar durante a pirataria e os costumes dos piratas daquele século. Os objetos recuperados ajudaram a entender a dinâmica das viagens marítimas do século XVIII e enriqueceram a pesquisa histórica sobre o período.

Na atualidade, os artefatos encontrados são exibidos em museus, como o Museu do WhyDah Gally em Provincetown, Massachusetts, que continua a educar o público sobre a história do navio e a pirataria, e a fornecer novas percepções para pesquisadores e adoradores da história marítima.

A marca do WhyDah Gally na cultura popular

A história do WhyDah Gally ressurge frequentemente nas páginas de livros e nas telas de cinema. O navio, seu capitão e suas aventuras de pirataria continuam a envolver o público moderno. Filmes como “Piratas do Caribe” e livros sobre piratas históricos frequentemente fazem referência a Samuel Bellamy e ao WhyDah Gally, perpetuando o mito do navio e seus marujos.

Além disso, a própria redescoberta do WhyDah Gally gerou uma onda de interesse por arqueologia marinha, com novas tecnologias e métodos sendo empregados para explorar os mistérios do fundo do mar. Isso reforçou ainda mais o encanto em torno dos navios piratas e da vida dos corsários.

Mitologia versus realidade

A ideia de grandes baús cheios de ouro e joias é frequentemente romantizada, mas o Whydah Gally é uma das poucas evidências reais de um navio pirata carregado de riquezas. Ainda assim, a descoberta de peças do tesouro, como moedas, é mais comum do que a recuperação de baús completos.

Portanto, embora baús possam ter existido a bordo do Whydah, o mais importante são os tesouros e objetos que contam sua história real, tornando-o um dos naufrágios mais fascinantes da pirataria.

Um tesouro da história e da arqueologia

Recapitulando, o WhyDah Gally é um marco na história da pirataria e da arqueologia. Sua ascensão e queda narram não apenas as aventuras de um capitão audaz, mas também refletem as complexas interações entre os impérios coloniais e a busca por liberdade e riqueza no século XVIII.

A redescoberta do navio, mais de 250 anos depois de seu naufrágio, reacendeu o interesse pelo estudo da pirataria e trouxe à tona uma herança de objetos e informações que continuam a enriquecer a nossa compreensão desse século turbulento. O WhyDah Gally, portanto, segue vivo na memória histórica e cultural, mantendo-se uma parte essencial da narrativa da pirataria.